Existe uma premissa no universo da reparação automotiva que nem sempre levamos à sério, mas quando envolve carros com elevado conteúdo tecnológico, é sempre ter bom senso. Assim, antes de sair desmontando o motor ou qualquer outro componente, estude bem o diagnóstico do defeito, pois nem sempre é o que parece ser.
No final do ano passado, recebi aqui na oficina um Audi Q5 2.0 TFSI com aproximadamente 80.000 km, blindado, de um cliente que possui outros carros mas este sempre fez as revisões em concessionária. Pois bem, chegou na oficina reclamando da luz de injeção acesa e perda da marcha-à-ré. A marcha engatava mas o carro não desenvolvia potência. À primeira vista, era problema de câmbio.
O scanner indicou um único defeito: sensor de rotação e comando de válvula sem comunicação. Opa! isso não tem nada a ver com câmbio. Com ajuda de um osciloscópio, confirmamos que algo estava errado no sistema de distribuição de força, que neste modelo é feito por corrente, e não correia de borracha.
Consultamos colegas e especialistas, e fomos atrás de mais informações e descobrimos que este motor (EA 888) possui um defeito crônico no esticador da corrente, muito comum de aparecer aos 80.000 km nos veículos Audi e Volkswagen fabricados entre 2008 e 2010.
O esticador foi desenvolvido de forma equivocada, e com o passar do tempo, com o desgaste da corrente, possibilita folga na corrente, suficiente para, nos piores casos, a perda total da sincronia do motor, com atropelamento de válvulas e perda dos pistões. Existem casos relatados em diversos idiomas desse defeito.
A partir de 2011, a montadora sanou este defeito com a mudança no projeto do esticador da corrente, que não permite mais este tipo de folga, mesmo se houver algum tipo de desgaste na corrente. Além disso, as novas correntes aparentam ser bem mais robustas do que as anteriores.
Estratégia
O fato de a luz de injeção acender no painel e o carro ficar sem marcha-à-ré é uma estratégia do veículo para obrigar o motorista a levar o carro para uma oficina e verificar o que está errado. O defeito nada tem a ver com câmbio.
Infelizmente no Brasil o conserto desse tipo de defeito é caro e não sai por menos de R$ 15.000. Um carro desses custa quase R$ 100.000, menos da metade do preço de uma zero km, porém os custos de manutenção são elevados e por isso o consumidor deve ficar atento antes de fechar negócio ao comprar um usado, pois a alegria pode acabar em pesadelo.
Editor da Revista Farol Alto