O cinema está repleto de automóveis que ganharam destaque em centenas de filmes. Quem não se lembra de James Bond, o agente 007, dirigindo um Aston Martin? A cena de Steve McQueen em uma perseguição implacável pelas ruas de São Francisco em um Mustang? Fusca, DeLorean, Mini, só para citar alguns que ganharam fama na telona. Mas para o Fiat 1.100, de 1947, o estrelato chegou depois de um longo tempo de esquecimento.
O carro estava abandonado em um posto de combustível no bairro de Realengo, Zona Oeste do Rio de Janeiro, e foi resgatado pelo funcionário aposentado da Embratel Orion Ximenes do Prado Filho, que também é ator e dublador. “Um amigo que morava em Realengo vivia me falando desse carro que estava jogado e coberto de lixo em um posto de combustível. Acabei indo até o local para ver, a paixão foi imediata”, conta.
“Descobri que o dono do veículo era um mecânico. Na época, em 1979, fiz uma proposta sem pensar em nada. Eu daria um Chevrolet 1952, em troca, ele me daria algum dinheiro. Só que existiam alguns problemas com o Fiat, como o IPVA atrasado fazia dez anos e estava sem o motor original”, explica Orion Ximenes.
Segundo o colecionador, mesmo com os problemas decidiu que iria recuperar o carro. Encontrou o motor original e pagou os impostos atrasados. “ O motor eu encontrei em um ferro-velho, já o IPVA tive que recorrer a um despachante. Para tirá-lo do posto abandonado, reboquei o 1.100 com meu Austin A90, de 1952, até uma oficina em Padre Miguel. Levei cerca de seis anos entre mecânica e pintura. O tempo de espera valeu a pena”, garante.
Caçada por peças
Reformar o Fiat não foi tarefa fácil, principalmente em uma época que não havia internet. Era preciso pesquisar, procurar publicações antigas, buscar pessoas que tivessem as peças. “ alguns itens foram encomendados nos exterior. Descobri que havia uma pessoa na Zona Oeste que tinha um galpão com peças originais. Tudo isso , sem a internet e controlando os gastos” comenta Orion.
Segundo Ximenes, o carrinho tem aproximadamente 80% de originalidade. “ Aquilo que não consegui comprar ou encontrar, me obrigou a fazer adaptações. Outras alterações que fui ‘intimado” a fazer veio da minha neta. Escolhi também pintá-lo em vermelho e preto. Ainda não foi sendo a cor original do veículo, acabou deixando o carro bem bonito”, garante.
Estrelato e coleção
O amor pelo Fiat 1.100 está em cada canto da casa de Orion. Na sala, entre centenas de miniaturas o carrinho se destaca entre tantos carros de épocas variadas. Na área de serviço tem muito mais do veículo. Quadros, chaveiros, caixas de fósforos e um arquivo que conta toda a história da raridade do colecionador. Na pasta estão os documentos originais, notas fiscais de todas as peças e serviços feitos e até uma multa aplicada em Copacabana, nos anos 1960.
“A história do carro está toda contada na pasta. Fiz questão de guardar tudo, desde as notas de peças, troca de óleo, serviço e o mais impressionante foi ter achado uma multa que foi aplicada no carro. São detalhes que fazem a diferença”, revela.
Em casa de ator, é claro que o carro também é estrela. Orion , para quem não sabe, participa de um anúncio de uma empresa de reparo de para- brisa. Aquele filme onde o astronauta deixa cair do espaço uma ferramenta que atinge em cheio um carro. Lembrou? Orion é quem está acabando de limpar o vidro do veículo.
Desde que a reforma do Fiat 1.100 foi concluída, ele já participou de inúmeras novelas. “ Só para citar algumas Terra Nostra, Ciranda de Pedra e Esplendor. Ele esteve presente ainda nas minisséries Maísa, Chacrinha, Dolores Duran, Hilda Furacão e Engraçadinha. No cinema participou dos filmes Chatô, Primo Basílio e Vestido de Noiva”, diz.
Claro que em todos eles o motorista foi Orion. “Muitos atores não sabem dirigir este tipo de carro. Por isso, acabei participando como motorista. Um dos poucos atores que dirigiu meu carro foi Osmar Prado, que tenho amizade. Mas sempre preferi dirigir o carro”, conta Orion Ximenes.
O colecionador diz que não pretende ter nenhum outro veículo antigo. “ Tenho 75 anos, quero ficar com meu Fiat. Não integro nenhum clube de carros antigos, só participo do encontro do Cadeg (evento que acontece no terceiro domingo de cada mês , na central de abastecimento localizada no bairro de Benfica). Gosto de sair com ele, as pessoas param para fotografar isso me faz feliz”, finaliza.
Antonio Puga é jornalista, especializado no setor automotivo